As notícias têm sido horríveis durante esta semana, com catástrofe atrás de catástrofe, a um nível que – se eu lesse isto num livro ou visse num filme – estaria a protestar que seria simplesmente demasiado improvável, demasiado rebuscado.
Mas temas para romances são retirados dos títulos das notícias a toda a hora. Ou então acontecimentos da vida real fazem lembrar ficção (quer sejam “acreditáveis” ou não) acerca da qual lemos mas nunca esperámos testemunhar. Ou então a vida real torna-se tão inacreditável que expande o nosso sentido de realidade.
Não consigo lembrar-me de uma pergunta concreta para fazer, mas pensando na teoria da ficção, em como pode afectar ou ser afectado por acontecimentos do mundo real, poder funcionar como efeito-tampão ao lidar com os horríveis acontecimentos das noticias, e a ter de facto que enfrentar esse horror. Então... O que acontece quando a linha entre ficção e realidade se torna demasiado ténue? Discutam!
A verdade é que não sei muito bem o que dizer acerca disto. Até estava para nem participar esta semana…
E uma das razões para isso é o facto de ser muito mais fácil lidar com acontecimentos desta gravidade e seriedade quando podemos fechar o livro e não pensar nos efeitos tão devastadores que significam. Por outro lado, em termos de emotividade, acho que mais facilmente nos perdemos nas páginas de um livro, e sentimos a aflição das personagens como nossas quando não passa de ficção. Certamente não deixo de me sentir tocada quando os acontecimentos são reais e concretos, quando envolvem pessoas reais e concretas. Mas penso que o choque da realidade da tragédia actua como uma espécie de filtro de emoções. É demasiado sério, demasiado terrível para imaginar. O mesmo acontece em livros de não ficção. Apesar de chorar em livros e filmes com facilidade e de não me importar com isso, quando li o livro Vendidas, de Zana Muhsen, não derramei uma lágrima. Ao ler aquela história, que sabia real e absolutamente verdadeira em todos os pormenores mais impressionantes, senti-me muitas vezes como um zombie, em choque. Depois da fase da incredulidade, o que senti foi uma profunda revolta e uma solidariedade genuína por aquelas e outras mulheres que sei que existem nas mesmas circunstâncias. Era demasiado sério para sentir pena. Emocionei-me com a realidade daqueles relatos e desejei poder mudar o mundo.
Tal como aí, a situação do Japão é demasiado séria para considerar seja o que for. Ao ver aquelas imagens horríveis e assustadoras senti por uns minutos uma incredulidade seguida de pânico interior. Parece que é como dizem, uma desgraça nunca vem só, e é isso que dá um toque tão irreal à tragédia. Se fosse um filme seria inverosímil. O que vou dizer a seguir pode ser considerado um ultraje, mas não me interpretem mal. No meio de tanta tragédia, a única sorte foi tamanha devastação ter ocorrido aos japoneses. Não conheço todos os povos do mundo, nem sequer conheço assim tão bem os japoneses, mas sei que se há povo capaz de recuperar desta calamidade, são o povo do Japão. Séculos e séculos de perseverança de uma cultura que luta contra a hostilidade da natureza, e que tem profundamente enraizado nas pessoas o sentimento de entre-ajuda, de construir a ordem e trabalhar para o bem comum. Nunca estive no Japão, mas li e ouvi relatos de estrangeiros maravilhados com esta cultura e vejo-o nos filmes, nas reportagens, e nos autores japoneses.
Ao mesmo tempo, são pessoas que não exteriorizam o sofrimento, de forma a não perturbar a ordem global. E mesmo quando esse sofrimento é terrível, como certamente o é agora, procuraram continuar com ordem e com força. São pessoas muito fortes e com uma mentalidade que lhes permite ultrapassar muitas dificuldades antes de se lembrarem de se lamentar. É por essa razão que estou convicta que este país se vai reconstruir mais rapidamente do que qualquer outro, e é graças à força das suas pessoas.
Be strong Japan.
Não acho que seja ultraje o que disseste. É verdade que os japoneses têm mais 'compostura' do que muitos outros povos. Em certas ocasiões, como a presente, tal é uma dádiva. Outras haverá em que é uma maldição, mas respeito-os imenso por conseguir manter a calma em situações destas. Imagina-se os portugueses a reagirem assim? Claro que não! Especialmente porque não estamos habituados a catástrofes desta (felizmente).
ResponderEliminarTal como tu, acredito que o povo japonês irá erguer-se desta tragédia, e seguir em frente. Foram tragédias atrás de tragédias, e em ficção, realmente, tais acontecimentos pareceriam algo inverossímeis, mas a verdade é sempre mais cruel do que a ficção.
Tens razão, Ana, eles estão, infelizmente, muito preparados para estas situações. Não seriam só os portugueses que seriam incapazes de reagir com toda esta calma e estoicismo, em todo o lado onde ocorrem tragédias, a preocupação seguinte são pilhagens e pânico das populações, desordem e insegurança nas ruas. No Japão não há relatos de pilhagens, e as filas no supermercado permanecem ordeiras mesmo quando começaram a faltar água e alimentos básicos.
ResponderEliminarSão de facto admiráveis e muito disciplinados.
Infelizmente a questão nuclear é bem mais difícil de lidar. Espero que a coisa não extrapole como se teme. Mas a verdade é que segundo muitos correspondentes lá, há mais pânico na Europa que no Japão.